Policiais Civis usurpam função de peritos criminais no Interior de SP


O Sindicato dos Peritos Criminais do Estado de São Paulo (SINPCRESP) recebeu denúncias de práticas preocupantes e, aparentemente, rotineiras em investigações conduzidas pela Polícia Civil no interior paulista. As denúncias apontam para sérias irregularidades na produção de provas, especialmente no que tange à constatação de substâncias entorpecentes e à extração de dados de aparelhos celulares, levantando questionamentos sobre a legalidade e a integridade de inquéritos criminais.

Segundo os relatos recebidos pelo Sindicato, a denúncia descreve que a "constatação preliminar" de drogas, etapa crucial para a materialidade do crime de tráfico, estaria sendo realizada de forma inadequada e irregular. Segundo as denúncias, há casos em que em que policiais presentes na delegacia, inclusive aqueles que apresentam o flagrante, realizam a “constatação” sem a devida qualificação pericial, antes que o material seja encaminhado para o Instituto de Criminalística (IC) para a perícia oficial.

A denúncia detalha um caso específico, ocorrido em Boracéia, no qual o "Auto de Constatação Preliminar de Substância Entorpecente" foi assinado por dois policiais que foram os próprios responsáveis pela prisão em flagrante. Os denunciantes enfatizam o inusitado e a preocupação de que os policiais figurem como "1º Perito(a)" e "2º Perito(a)" no documento, questionando a isenção de quem realiza a prisão para também atestar a natureza da droga.

Outro caso, registrado em Urupês, é ainda mais alarmante, segundo os relatos. O "Auto de Constatação Preliminar de Substância Entorpecente" não indica quem seriam os "peritos" que assinaram, deixando os campos em branco. Apenas a assinatura do Delegado de Polícia consta ao final do termo. Para os denunciantes, essa prática "se tornou rotina no interior", onde a "constatação de drogas" é feita por policiais sem qualificação pericial adequada, antes de ser enviada ao IC. "A usurpação da função de perito criminal por outros agentes de segurança pública é um desrespeito flagrante à legislação processual penal, que atribui essa prerrogativa aos profissionais especializados e imparciais da Polícia Científica. O Código de Processo Penal é claro sobre a necessidade de perícia técnica para a comprovação da materialidade de certos crimes, e a adulteração ou a ausência dessa formalidade compromete toda a cadeia de custódia e a própria validade da prova", afirma o presidente do SINPCRESP, Bruno Lazzari.

Violação de sigilo
As denúncias também abordam a grave questão da extração de dados de aparelhos celulares sem a prévia e formal autorização judicial, o que, para o presidente do SINPCRESP, Bruno Lazzari, configura uma clara violação do sigilo telemático dos envolvidos.

Um dos casos citados, o celular da adolescente envolvida em um crime foi apreendido e seus dados foram extraídos pela "Unidade de Inteligência Policial" antes mesmo que uma ordem judicial autorizando a quebra de sigilo fosse expedida. A autorização judicial para a extração dos dados só teria sido concedida dias depois, indicando uma tentativa de "legalizar" a prova, ou seja, de legalizar uma obtenção de dados já realizada de forma irregular.

Segundo a denúncia, “a extração de dados sem autorização judicial", evidencia uma prática em que se busca obter o acesso a informações sigilosas de forma irregular e, posteriormente, enviar o material para a perícia do Instituto de Criminalística, supostamente para "esquentar a prova", conferindo-lhe uma legalidade retroativa. "É inadmissível que, com a tecnologia disponível e a clareza da legislação, ainda nos deparemos com a obtenção de provas digitais à revelia da lei. O artigo 5º, inciso XII, da Constituição Federal, e o próprio Código de Processo Penal são categóricos: a quebra de sigilo de comunicações exige ordem judicial. Provas obtidas por meios ilícitos são nulas e contaminam todo o processo, levando à impunidade e abalando a credibilidade do sistema de justiça", reitera Bruno Lazzari.

O SINPCRESP reitera que a legalidade na fase inicial da investigação é fundamental para a validade de todo o processo criminal e para a confiança da sociedade no trabalho das instituições. O SINPCRESP considera essas denúncias de extrema gravidade, pois afetam diretamente a cadeia de custódia da prova e a credibilidade do trabalho pericial. O Sindicato levará essas denúncias às autoridades competentes, buscando apuração rigorosa dos fatos e a garantia de que as investigações policiais sejam conduzidas dentro dos mais estritos parâmetros legais, assegurando a lisura da prova e o respeito aos direitos fundamentais dos cidadãos. O SINPCRESP reforça seu compromisso com a defesa do devido processo legal e com a integridade da atuação policial em todas as suas esferas.

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