O estresse na vida profissional do policial


O estresse ocupacional é um problema de saúde global, com alta prevalência e impacto na saúde dos trabalhadores. Preocupados com isto, diversos países têm estabelecido políticas e normas que visam minimizar os riscos psicossociais do estresse ocupacional, como Canadá, Luxemburgo, Suécia, Japão, Singapura, Espanha, entre outros.

O estresse ocupacional além de ter efeitos deletérios ao organismo humano, com o desenvolvimento de problemas de saúde mental e física, pode afetar negativamente a eficiência do trabalhador, e sua satisfação no trabalho. Por isto é fundamental conhecer os fatores estressores, que podem estar ligados à própria natureza da tarefa exercida, à ambiguidade e conflito na função, aos relacionamentos difíceis no trabalho, à falta de plano de carreira, ao clima organizacional prejudicado e ao desequilíbrio entre carreira e família.

Embora todas as profissões sejam geradoras de certo grau de estresse, algumas chamam a atenção devido ao alto nível de tensão envolvida. Entre essas, encontra-se a do policial, apontada como uma das ocupações de maior risco.

Em vários estudos comparativos, a atividade policial ocupa a segunda posição no ranking das mais estressantes, uma vez que profissionais desta área estão constantemente expostos ao perigo e à agressão, situações que acarretam sobrecarga física e emocional. Adicionalmente, esses profissionais têm de lidar com hierarquia, grande quantidade de burocracia, desequilíbrio entre recursos e exigências, falta de suporte do sistema policial, falta de preparo e hostilidade dos cidadãos ante a imagem pública da polícia, etc.

Outro estressor intrínseco da profissão é o perigo sempre presente, durante e fora do horário de trabalho e as ameaças que são feitas as suas famílias. Adicionalmente, o estresse pode surgir do desequilíbrio entre a convivência com a família e a carga de trabalho do policial, que tem de estar disponível para as emergências 24 horas por dia. Trata-se de uma atividade de risco, uma vez que esses profissionais lidam com a violência, a brutalidade, a morte de desconhecidos e a possibilidade de sua própria morte e a de colegas, além das emoções ligadas ao próprio ato de ter de matar alguém durante o policiamento.

Pelas características da profissão, o policial é um forte candidato ao estresse ocupacional, que propicia o surgimento de patologias e disfunções físicas, como hipertensão arterial, úlcera gastroduodenal, obesidade, câncer e doenças dermatológicas, além de transtornos mentais, como depressão, agressividade e até o suicídio (especialmente preocupante já que policiais têm acesso fácil a armas). Além do aspecto pessoal, há implicações sérias para a comunidade, uma vez que estudos mostram que policiais com estresse empregam mais violência contra a população.

Uma pesquisa realizada no Estado de Mato Grosso, com o apoio da Secretaria Nacional de Segurança Pública (SENASP) e em conjunto com a Secretaria de Segurança Pública daquele estado, entre 2010 e 2012, demonstrou alto nível de estresse ocupacional em policiais (Lipp, Costa e Nunes, 2017).

No estudo citado acima, participaram servidores da Secretaria de Segurança Pública do Estado de Mato Grosso, em um total de 1.837 homens e mulheres distribuídos da seguinte forma: 1.017 policiais militares (PM), representando 55,36% da amostra; 454 (24,71%) policiais civis (PC); 108 (5,88%) bombeiros militares (CB); 68 (3,70%) peritos criminais (POLITEC) e 190 (10,35%) da área administrativa.

Verificou-se que 52% dos avaliados apresentavam sintomas significativos de estresse, o que ultrapassa de modo significativo a média do país, que é 35%. Nesta pesquisa, a POLITEC apresentou um índice maior de pessoas estressadas (61,76%), seguida pela PC (56,83%) e, depois, da PM (50%). O CB conta com o menor índice (41,67%). Em relação às fases do estresse, 3% estavam na fase inicial (alerta), 75,5% se encontravam na fase intermediária (resistência), 6,12% já apresentavam sintomatologia típica da fase grave de quase exaustão e 9,5% estavam na mais grave e comprometedora, que é fase de exaustão. E, existiram diferenças significativas entre as instituições também, conforme mostra a tabela abaixo:

Os cinco sintomas mais frequentemente assinalados pelos policiais entrevistados, considerando-se as instituições conjuntamente, foram: sensação de desgaste físico constante (52,33%), tensão muscular (50,74%), problema com a memória (43,38%), cansaço mental (43%) e insônia (33%). Em média, foram detectados 12 sintomas de estresse por servidor, havendo casos de policiais com 60 sintomas significativos. Os sintomas detectados em um número significativo de policiais e a incidência de estresse verificada têm implicações para o nível atual e futuro da atuação da Secretaria de Segurança Pública. Esses sinais revelam que um número grande de policiais está funcionando na fase de resistência, que é aquela durante a qual a pessoa ainda produz, porém com dificuldades.

Tabela com nível de servidores comprometidos pelo stress ocupacional

Em relação aos fatores estressores, o mais frequentemente mencionado pela PM (95%) e pela POLITEC (82,46%) foi "não receber o apoio dos superiores", seguido de "tomar conhecimento de interpretações erradas da mídia" (94,70% na PM e 79,83% na POLITEC) e "ver a polícia sendo criticada publicamente" na PC (90%). Uma fonte de estresse considerável e que merece atenção da instituição é a falta de equipamento adequado para desempenhar as funções diárias, mencionada por 94,64% dos policiais, e "receber treinamento insuficiente ou inadequado", assinalado por 92% deles como grande fonte de estresse ocupacional.

Em termos de planejamento quanto à qualidade de vida dos servidores, a manutenção de níveis de estresse altos por um período prolongado pode interferir na produtividade, criatividade, poder de concentração e de raciocínio lógico, culminando em erros. Pode também significar uma alta em custos médicos, licenças médicas, farmacodependência e absenteísmo.

Ou seja, o alto nível de estresse encontrado no estudo realizado em Mato Grosso, e em um grande número de policiais pode, eventualmente, levar à redução de produtividade e prejudicar a habilidade de tomada de decisão em momentos críticos. Assim, é clara a necessidade de campanhas preventivas que possam colaborar para a aquisição de estratégias de enfrentamento do estresse ocupacional e a consequente redução do nível de estresse detectado. Necessários, também, são os programas de controle do estresse para os policiais já sofrendo de estresse ocupacional excessivo, e que mudanças organizacionais sejam implantadas com o objetivo de se ter um corpo policial capaz de desenvolver suas competências por meio do apoio e do reconhecimento de seu valor por seus superiores. A valorização do policial e do papel que exerce na sociedade são pontos fundamentais em qualquer programa de ação que vise reduzir o estresse e melhorar a qualidade de vida dessa classe ocupacional.

E você, perito, se identificou com este estudo?

Quer saber mais? Leia a pesquisa na íntegra em clicando no link a seguir estresse ocupacional.

 Fonte: LIPP M. E. N., COSTA K. R., NUNES V. O. Estresse, qualidade de vida e estressores ocupacionais de policiais: sintomas mais frequentes. Revista Psicologia Organizações e Trabalho. V. 17, n. 1, 2017.

 

 

 

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